quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

NOTURNO, de Guillermo del Toro e Chuck Hogan


Você, fã do horror, já deve ter ouvido falar desse livro sobre vampiros, que está disponível nas principais livrarias do país. E com destaque digno dos maiores best sellers! E não é para menos, afinal, um dos autores é o famoso cineasta Guillermo del Toro, diretor de preciosidades como A Espinha do Diabo e O Labirinto do Fauno (embora seja mais conhecido por ter dirigido os dois filmes do Hellboy). Associado com o escritor Chuck Hogan, Guillermo nos trás uma premissa diferente da maioria dos livros sobre vampiros, que parece originalíssima para aqueles que pouco conhecem sobre o tema, mas que infelizmente não trás muitas novidades para os mais escolados.

Noturno começa em um delicioso tom de fábula, que lembra bastante o início de Hellboy 2 (falar mais detalhes poderia ser considerado como spoiler); a narrativa logo dá um salto no tempo, quando o Boeing 777 aterrisa em Nova York. Logo após o pouso, o avião permanece misteriosamente parado na pista com as luzes apagadas, como se fosse um gigantesco túmulo. A equipe de emergência vai averiguar o acontecimento bizarro em um início tenso e bastante eficiente, quando descobrimos o que aconteceu com a tripulação e os passageiros. A partir disso, o epidemiologista Eph Goodwheather se vê envolvido com uma estranha epidemia vampírica, que parece ter sido planejada por forças maiores do que poderia imaginar.

Muito mais que um livro de horror, a obra se trata de um thriller escrito segundo a cartilha de um Robin Coock ou um Michael Crichton menos detalhado: privilegia-se a ação e o suspense (é preciso impedir uma tragédia que está prestes a acontecer, numa corrida contra o tempo), em detrimento dos personagens que, quase sempre, são bastante rasos (apresenta-se um personagem; fala-se um pouco sobre sua vida; coloca-se o personagem em ação, sem voltar a aprofundá-lo). Em resumo, o mesmo esquema de nove entre dez thrillers disponíveis no mercado, o que pode ser vantagem para alguns leitores e desvantagem para outros. O bacana nos livros nesse estilo é que eles costumam ser de leitura agradável e ágil, do tipo que prendem o até a última palavra. No entanto, Noturno é um pouco falho nesse aspecto, pois lhe falta aquele "algo mais" que motiva a leitura ininterrupta.

Um autor como Michael Crichton, por exemplo, fazia amplas pesquisas antes de escrever seus livros, o que gerava obras repletas de informações interessantes e inesperadas sobre ciência, antropologia, tecnologia ou qualquer outro tema que importasse para a trama; Dan Brown, por sua vez, tem a capacidade de formular enigmas interessantes em um contexto histórico e artístico, que despertam uma curiosidade imensa para chegar ao desfecho; Tom Clancy escreve sobre a guerra moderna e todos os seus aspectos mais fascinantes, o que faz de seu trabalho um prato cheio para quem é chegado em assuntos bélicos. Enfim, os autores de best sellers conseguem destaque por suas características próprias, que os tornam queridos por determinado nicho de leitores. E é isso que falta em Noturno, algum diferencial de verdade. Escrever um thriller com temática de horror, além de não ser novidade, ainda é muito pouco para sustentar uma narrativa nesse estilo.

O livro é até agradável de ler, mas ao menos em mim, não despertou aquela sensação de "não consigo parar de ler". Não é o tipo de obra que se lê em uma tacada só, pois embora mantenha o interesse em alguns trechos, se torna bastante cansativo em outros. Por exemplo, acompanhamos com entusiasmo as primeiras transformações dos infectados e seus ataques, porém tais situações vão apenas aumentando (para dar o tom da ameaça crescente), e como não mudam muito, acabam se tornando repetitivas . O tom científico dado ao tema do vampirismo, com explicações para a metamorfose, o apetite por sangue e tudo mais, certamente será novidade para muitos leitores, mas não para aqueles que já leram o espetacular (e muuuuito superior) Eu Sou a Lenda, de Richard Matheson. Se você ainda não conferiu essa preciosidade, acredite: as explicações de Matheson eram muito melhor equilibradas e faziam mais sentido.

Talvez por ser o primeiro romance do cineasta, de vez em quando nos deparamos com um ou outro erro grosseiro na escrita (mas era de se esperar que o outro escritor não deixasse isso passar em branco). Por exemplo, em determinado trecho, um dos personagens precisa se defender de uma das monstruosidades com o que tem à mão; para sua sorte ele está em um hospital, e o que encontra mais próximo é uma daquelas serras usadas para cortar crânios... Só que o autor literalmente interrompe a ação para dizer o nome do aparelho e explicar detalhadamente sua função, aparência, etc! Enfim, um trecho que tinha por objetivo causar aflição acaba comprometido por um didatismo forçado.

Sobre o livro em si, a impressão que se tem é que del Toro resolveu testar um roteiro antes de filmar, lançando-o em forma de romance para fazer pesquisa de mercado. Além disso, as criaturas de Noturno lembram vagamente os sanguessugas do competente Blade 2, também dirigido pelo cineasta. Aliás, interessante notar que em determinado momento do livro, alguns personagens se armam com traquitanas ao estilo do personagem de Wesley Snipes, inclusive utilizam uma arma IDÊNTICA a uma que é usada no filme do caçador de vampiros da Marvel. Isso me faz pensar que a idéia para o livro deve ter surgindo enquanto Blade 2 era filmado, mas não posso provar nada. :)

Mas é claro, ainda é um livro com um dedo (ou dez) de Guillermo del Toro, então muita coisa se salva. As tais explicações científicas, embora rasas e um tanto confusas, são grotescas o bastante para satisfazer o apetite de sangue dos leitores mais mórbidos (eu incluso, he he). Por exemplo, aqui você encontrará a resposta para uma questão que há muito tempo desafia a humanidade: o que os vampiros defecam? :P

Os sanguessugas aqui são do tipo monstruoso, e não os mortos-vivos aristocráticos (ou que brilham ao sol) que estamos mais habituados. O vilão principal, inclusive, é mauzão pra valer! Além disso, muitas passagens de suspense e terror funcionam a contendo, e é possível sentir o coração acelerando e um ou dois calafrios (o que, convenhamos, é mais do que muitos outros livros de horror). Há passagens de uma inventividade que beira o genial, como aquela em que um astro de rock recém-contaminado vai limpar a maquiagem que usa nos shows (com olheiras negras e face pálida), apenas para descobrir que o rosto por baixo está quase igual! Infelizmente, tais aspectos são insuficientes para tornar a obra memorável.

Resumindo, Noturno não é um livro ruim. É gostoso de ler e é competente em diversos aspectos. Porém, é cansativo em algumas partes, e seus personagens não conseguem a empatia do leitor. Essa falta de empatia é até algo comum em livros do estilo, só que aqui fica faltando aquele "algo mais" que compensa a falta de personalidade dos heróis. Não sei o quanto a escrita à quatro mãos atrapalhou (ou ajudou) no processo, mas enfim, apesar de todos os poréns, fiquei curioso para ler a inevitável continuação (ao que parece, será uma trilogia). Só me resta torcer para que os próximos episódios sejam melhores.

Abraços!

3 comentários:

  1. Isso não é um livro, é roteiro. Breve nos cinemas, rs.

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  2. São muitos personagens. Seria impossível se aprofundar psicologicamente em cada um deles.
    Os vampiros e o prof. Setrakian são bem descritos.

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