sábado, 12 de fevereiro de 2011
O PACTO, de Joe Hill
Mais um livro do filhote de Stephen King saiu no Brasil. Depois do inconstante A Estrada da Noite (que começa bem, mas se perde após a metade final) e do excelente Fantasmas do Século XX (cuja resenha pode ser conferida aqui), a editora Sextante trás o ótimo O Pacto, sobre um homem que se transforma... no diabo!
Premissas que flertam com o realismo mágico ou a simples fábula são uma constante na obra de Joe Hill, que nos presenteia com uma obra que não fará muito sentido para o leitor comum, mas agradará em cheio os fãs do horror. A trama, sem muitos spoilers, é mais ou menos a seguinte: o azarado Ignatius Perrish acorda um belo dia com chifres na cabeça; deixando as piadinhas de lado (embora acabe sendo revelado que ele foi corneado mesmo, he he), o atônito personagem descobre que seus novos adereços causam um estranho efeito nas pessoas: elas revelam seus piores pecados e mais obscuros desejos, como se estivessem conversando com seu demônio interior. Assim, Ig (apelido carinhoso do personagem) é obrigado a escutar os maiores horrores de seus amigos e parentes, descobrindo aquilo que as pessoas que mais confiava pensam dele... ou pior, fizeram para ele. Com uma recente tragédia em seu passado (sua namorada foi estuprada e morta, e ele foi um dos principais suspeitos no início), o ressentimento que era mantido nas profundezas por todos à sua volta acaba vindo à tona, com consequências literalmente infernais como, por exemplo, descobrir quem é o verdadeiro assassino.
Nesse livro, a escrita de Joe Hill está mais próxima da de seu papi, alternando passagens no presente com a pré-adolescência de Ig, sua relação com a (apaixonante) namorada Merrin e com seu estranho amigo Lee. Particularmente, gosto bastante dessa estrutura (conhecemos os personagens quando já estão bem avançados na trama, então a história volta e ficamos sabendo como eles se conheceram e de que forma a situação os levou até ali), acho que é uma forma muito válida de despertar curiosidade no leitor. Hill constrói os momentos nostálgicos com maestria, quase lembrando a genialidade com que seu pai constrói personagens infantis (vide A Coisa, O Iluminado, A Hora do Vampiro, O Talismã e tantos outros), mas ainda com um estilo próprio e marcante. Joe Hill não é tão engraçado ou detalhista, sua ironia pontua frases muito mais sucintas e, talvez, mais elegantes, recheadas de citações à cultura pop. Seus personagens lembram mais o estilo Neil Gaiman, calados e pouco expressivos, mas que conseguem ser carismáticos mesmo sendo discretos, nunca rasos, sempre bastante ambíguos.
Mesmo que esteja, de certa forma, se "transformando no demônio" e dando vazão ao seu lado obscuro (inclusive com uma hilariante cena envolvendo uma avó e uma cadeira de rodas), Ig continua sendo o (anti?) herói da história, lutando para fazer justiça à amada morta, embora não saiba se ela foi uma pessoa muito boa em seus dias derradeiros. O vilão (que não posso revelar aqui) é um dos personagens mais interessantes que vi nos últimos tempos, o perfeito psicopata frio e sedutor, que está sempre um passo a frente dos demais. Entrou pra minha galeria de vilões favoritos.
O Pacto não é um livro exatamente de horror, talvez seja mais uma fantasia sombria, com momentos de refinadíssimo humor negro, tensão, revolta e um ou outro trecho legitimamente assustador (um em especial, envolvendo uma casa de árvore e um altar pagão, me deu calafrios). O dúbio clímax do livro é um dos mais satisfatórios que li nos últimos tempos, do tipo que não seria aprovado pela Liga das Senhoras Católicas, mas que agradará você, leitor pronto para histórias que cruzam as fronteiras da moral e dos bons costumes, he he. Enfim, fica mais uma dica para quem está afim de uma obra diferenciada, até um pouco difícil de enquadrar, mas que agradará em cheio os fãs da ficção de terror.
Abraços, boa leitura.
Assinar:
Postagens (Atom)